Ashoka comemora e celebra a vida e o trabalho deste Ashoka Fellow falecido.
Ana Maria Vasconcelos é advogada de Recife, no Nordeste do Brasil. Depois de praticar a advocacia e ser ativa no movimento feminista, ela assumiu a tarefa negligenciada e terrivelmente difícil de encontrar maneiras de ajudar as meninas de rua do país.
Ana nasceu em Recife e também morou no Rio de Janeiro. Hoje com 34 anos, ela é graduada em direito e pós-graduada com especialização em desenvolvimento urbano e rural. Como uma jovem advogada, ela defendeu prostitutas na Republica Plaza, no Rio de Janeiro. Voltando ao Recife em 1981, Ana se tornou ativa no movimento de mulheres e em organizações de direitos humanos. Em 1986 passou a conhecer meninos de rua por meio de seu trabalho na "Liga Assistencial do Recife" (LAR). Ela ajudou a criar uma linha direta para a qual as crianças de rua poderiam ligar quando precisassem de assistência jurídica ou médica. Ana sempre se interessou especialmente pelas necessidades especiais de meninas sem-teto e lutou para estabelecer um programa separado para elas no LAR. Suas experiências a levaram a publicar um livro sobre a vida das meninas de rua do Recife. O volume atraiu muita atenção crítica, tanto positiva, de pessoas que sentiram que o sistema precisava ser mudado, quanto negativa, principalmente daqueles que o livro retrata de forma desfavorável. Ajudou a chamar a atenção para o problema e recrutou novos trabalhadores.
Meninas de rua têm sido um assunto impensável, embora uma realidade onipresente, no Brasil há anos. Ana está no trabalho pesquisando o problema e a melhor forma de resolvê-lo, demonstrando sua abordagem e forçando o problema à vista - e a sociedade a começar a responder - com um holofote poderoso. Ela gradualmente desenvolveu uma abordagem que funciona. Primeiro, ela tenta ajudar as meninas a sair e ficar fora das ruas. Ela as respeita quando jovens, mas aconselha a elas e a suas famílias sempre que possível. Ela dá atenção especial ao trabalho preventivo com mães, filhas e netas de prostitutas. O centro de sua abordagem é uma casa à qual as meninas podem ir diariamente para trabalho, treinamento, cuidados médicos e outros, uma lavagem, aconselhamento, relacionamentos confiáveis e segurança simples. Para uso dentro e fora de casa, ela desenvolveu maneiras respeitosas que o suposto interventor pode usar para construir relacionamentos de trabalho eficazes com essas jovens mulheres com feridas graves. Ao mesmo tempo, Ana está lutando pelos interesses das meninas. Ela está expondo a discriminação e a exploração que sofrem por parte da polícia e das próprias instituições que deveriam protegê-los. Recentemente, por exemplo, ela processou um hospital público por discriminar uma criança de rua levada para tratamento de emergência. Em última análise, Ana espera que suas pesquisas e experiências ajudando as meninas e lutando por seus interesses ajudem o Brasil e suas instituições a desenvolver uma vida honesta, abordagem cuidadosa e eficaz para os menos afortunados de seus cidadãos. Ela já publicou um livreto influente definindo o problema e sugerindo como indivíduos e instituições podem ajudar melhor.
Há centenas de meninas sozinhas nas ruas de Recife. E eles são apenas uma pequena fração das crianças em risco; O UNICEF relata que vários milhões de meninas brasileiras de quinze anos ou menos estão engajadas na prostituição. A pesquisa de Ana e seus vários anos de trabalho permitiram que ela traçasse um perfil da situação de uma menina de rua média de Recife. Segundo Ana, a maioria das meninas sai de casa com 6 ou 7 anos de idade, vítimas de abusos sexuais ou, mais frequentemente, de carência econômica. Uma vez na rua, eles aprendem a enfrentar a violência policial, as drogas e o crime e, para muitos, a prostituição se torna a principal alternativa viável. Presas e muitas vezes abusadas pela polícia, essas meninas geralmente acabam no Centro de Atendimento Temporário (CAP) de Recife, local que Ana descreve como pouco mais que uma prisão. Terminada a pena no CAP, as meninas voltam para a rua. O ciclo recomeça, podendo se repetir por até dez anos, até que as meninas deixem de ser menores. Para Ana, um dos obstáculos fundamentais para quebrar esse ciclo é o preconceito masculino das instituições públicas e privadas em lidar com crianças de rua. Embora muitos assistentes sociais sejam mulheres, elas são freqüentemente indiferentes às necessidades especiais das meninas sem-teto e geralmente têm um forte preconceito contra a prostituição. A maioria prefere culpar as vítimas em vez do sistema por sua situação. "Eles gostam da vida nas ruas", "gostam da prostituição" e "são apenas preguiçosos" são comentários comuns. Na realidade, jovens prostitutas, mesmo aquelas no início da adolescência, são tratadas e maltratadas como mulheres de rua e não como crianças de rua. Isso permite que as instituições evitem confrontar e responder às suas necessidades e problemas muito diferentes.
Ana originalmente começou a experimentar mais do que intervenção família por família no ano passado. Ela lançou uma série de grupos de discussão entre mulheres de todas as gerações em uma comunidade fortemente dependente da prostituição. Mães, filhas e netas pensaram juntas sobre as questões e direitos das mulheres e sobre as possíveis maneiras de ganhar a vida além da prostituição. Ela planeja outras experiências nos próximos um ou dois anos. Sua prioridade mais imediata ao servir as meninas com quem tem trabalhado é abrir uma casa que dará uma base para as meninas e para o trabalho dela com elas. Além de fornecer os serviços necessários (médico, jurídico, psicológico, treinamento, aconselhamento pessoal e ocupacional), ela espera que tal casa segura ajude as meninas a construir identidades mais fortes, tanto individuais quanto coletivas. Também ajudaria a protegê-los contra vários exploradores. Uma parte importante da estratégia de Ana envolve alcançar o resto da sociedade, tanto em Recife como fora dela. Ela tem usado a imprensa em Recife de forma muito eficaz, tanto para educar quanto como aríete para a mudança. Ela também escreve para a imprensa nacional ocasionalmente e agora está intrigada com a organização de encontros municipais e, posteriormente, em nível nacional com meninas de rua. Se suas experiências piloto forem bem-sucedidas, ela gostaria de levar o modelo para outras cidades do Brasil. À medida que sua pesquisa e experiência amadurecem, ela também considerará a possibilidade de escrever um livro para garantir a difusão das lições que está aprendendo.